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Os textos da quarentena na síntese da editora Chiado Books

Sim. Tenho-me posto a observar pássaros pela manhã.


Não que algumas noites não tenham sido temerárias, com o anúncio jornalístico da progressão das mortes tecnicamente subnotificadas. Nem sempre pelo desinteresse da esfera de poder institucional, algo notável em tempos de calamidade pública.


Tomo conhecimento da luta dos trabalhadores da área da Saúde para evitar óbitos e não se contaminarem ao mesmo tempo. Uma batalha para a saúde mental de qualquer pessoa.


No quintal que fica nos fundos da casa, há um coqueiro plantado por meu pai há uns 15 anos. Depois que ele começou a frutificar, nunca mais ousou parar. Tornou-se ponto de encontro de pássaros pela manhã. Ora surgem os bentevis, alguns solitários e tomados por uma certa timidez, ora um grupo de periquitos. Ali ficam se bicando ou deixando ser bicados por um companheiro. Alheios a qualquer decreto de calamidade pública. Exercitam o pleno direito de serem o que são: pássaros livres.


Dizemos que os pássaros são livres porque voam de um galho a outro quando bem entendem. Enquanto um vírus nos aprisiona quando nem sabemos definir o que é de fato: liberdade.


Lutamos diariamente pela sobrevivência, livres ou emparedados. Melhor é ver pássaros imprevisíveis, enquanto os humanos seguem, quase sempre, tomados de certezas e indispostos a sorrirem para o sol da manhã.

Lecy Sousa


Do Livro: Quarentena – Memórias de um País Confinado – Brasil – Editora Chiado Books – 2020 – Página 268

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